domingo, 15 de maio de 2011

A HISTÓRIA DO BAIRRO DO ALVORADA


O bairro do Alvorada destaca-se por ser um dos bairros mais populosos da cidade, fica localizado na Zona Centro-Oeste de Manaus e segundo o Decreto Municipal n.º924, de 1995, que instituiu a divisão geográfica da cidade, determinou que fazem parte desta Zona, os bairros e os Conjuntos: D. Pedro I, Planalto (Conj. Campos Elíseos e Conjunto Ajuricaba), Redenção e Bairro da Paz.   
A sua população chega a quase noventa mil habitantes. O Alvorada é um dos bairros mais tradicionais e antigos da capital, e conta também com uma enorme diversidade de lojas, o que o torna um bairro residencial e comercial.
O processo de ocupação do bairro aconteceu de forma pacifica e ordenada no final dos anos sessenta. Neste período o estado do Amazonas passava por um aumento considerável de sua população, devido principalmente ao êxodo rural. Conseqüência, sobretudo do desenvolvimento e prosperidade que prometia a Zona Franca de Manaus.  Além é claro, dos inúmeros canteiros de obras que se abriam por todas as partes da cidade que alimentavam os sonhos dos manauaras e principalmente dos interioranos que se transferiam com suas famílias para a capital, em busca de trabalho e melhores condições de vida.
Essas famílias ao chegarem a Manaus, na sua grande maioria ou iam morar de aluguel ou em casa de parentes, vivendo num amontoado, sem o mínimo de conforto e passando as mais diversas necessidades.
As obras da construção do Estádio de Futebol Vivaldo Lima, contribuíram bastante para a fundação do bairro, Isto porque consumiu uma grande quantidade de mão de obra da capital, do interior e de outros estados do país.
Coincidentemente o estádio foi construído bem na entrada do Bairro do Alvorada. O Conjunto Cohabam de Flores já havia sido construído ao seu lado, e os primeiros moradores começavam a habitá-lo.
O Vivaldão já estava na fase final de suas obras. E os encarregados necessitavam de pessoal especializado para fazerem o gramado, profissionais que não havia em Manaus naquela época.
Naquele ano o Governador do Estado era o Dr. Danilo Duarte de Mattos Areosa, que governou o estado no período de 1967 a 1971. Ele ordenou que o então Secretário da Produção Rural Dr. Hugo Bezerra Brandt, viajasse para Brasília em busca desses técnicos. Dentre os contratados pelo secretário em Brasília, estava um engenheiro agrônomo chamado Dr. Cezar Najar Fernandes, índio peruano, descendente do império Inca, nascido na cidade de Juliaca próximo ao Lago Titicaua Puno no Peru. O Dr. Cezar, como era chamado, trabalhou na construção de Brasília desde inicio das obras, e foi um dos primeiros a serem contratados pelo governo do Amazonas para trabalharem em Manaus em 1968. Ele conta que logo se adaptou a cidade. Tornou-se o responsável pelo gramado do estádio. Percebeu que em Manaus o tipo de gramado que necessitava era muito difícil. Resolveram então plantar grama num terreno da secretária no bairro do Aleixo. A secretaria mantinha um depósito no bairro de Educandos, onde constantemente ele tinha que ir buscar material para a obra. Aproveitava sua estada no bairro para apreciar o maravilhoso Rio Negro. Numa dessas caminhadas pelo Educandos, conquistou uma namorada que morava em uma casa no bairro flutuante, um aglomerado de palafitas que se formara na orla do rio do Educandos. Todas as vezes que ele ia deixar sua namorada em casa, tinha que pegar uma catraia, chegando lá, sua namorada entrava em casa subindo pelo telhado. Esta situação lhe deixava incomodado, e o que mais lhe causava indiguinação, era não saber o porquê de como numa cidade onde havia tanta terra, existiam tantas pessoas morando dentro do rio?
Gozando de uma boa relação com o Dr. Hugo Bezerra Brandt, chegou a pedir que ele o ajudasse a fazer um bairro nas terras próximas do Vivaldão, para abrigar aquela gente do bairro flutuante, o secretário dizia que não podia fazer nada, pois eram terras destinadas para outras coisas. Inconformado, falou com vários companheiros de trabalho sobre o seu plano e pediu a ajuda de todos, pois, sabia que muitos deles não tinham casa própria e tudo dando certo, todos poderiam ganhar um terreno.


 Após todos concordarem em ajudá-lo, definiu que só trabalhariam aos sábados e domingos, para não atrapalhar o andamento das obras do Vivaldão. O trabalho deles consistia em abrir caminhos nas matas, fazer a topografia, o arruamento e organizar a divisão dos lotes, que seriam tamanho padrão de 8x20. O trabalho fluía bem, todos os sábados e domingos o Dr. Cezar e seus companheiros iam para a área fazer demarcação das terras e distribuir lotes. Um dia o chefe da obra do Estádio, proibiu a todos que continuassem a fazer aquele serviço, do contrário seriam demitidos. Diante da situação, o temperamento indígena falou mais alto. O Dr. Cezar pediu sua saída das obras do estádio e seu retorno para Secretaria de Produção Rural, onde era lotado, o que foi aceito pelos seus superiores, como conseqüência deste ato, ele perdeu várias gratificações financeiras, que iriam lhe trazer muitas conseqüências no futuro. Pra ele não importava o que poderia acontecer, o importante era que ele havia feito daquele trabalho, sua missão, seu ideal e nada lhe faria desistir de concluir o que havia começado.
Agora com mais tempo, acelerou os trabalhos, todos os dias chegavam multidões de pessoas em busca de um lote. Todas as manhãs o índio mandava formar três filas, como a predominância eram de mulheres, ele dividia as filas da seguinte forma: uma fila era feita só com pessoas idosas e deficientes, outra com jovens e outra com mulheres grávidas. Ele relacionava os nomes das pessoas, e entregava uma senha com um número a cada uma delas. Conforme os lotes eram medidos, ele passava para o portador da senha da vez e dava trinta dias para a construção da casa. Muita gente reclamava do tempo dado, aí ele era duro, dizia que quem realmente precisasse do terreno daria um jeito de fazer a construção no prazo determinado, brincando, falava para fazerem um rabo de jacu e entrar dentro, ou seja, fincar três estacas na terra em forma de xis e cobrir com palhas.
Os primeiros a ganharem lotes, realmente foram os moradores do Bairro Flutuante que ficavam nos beiradões do Bairro do Educandos e Compensa. A notícia se espalhou e logo apareceram pessoas de vários lugares da cidade. O interessante é que até naquela época, muita gente chegava com cartão e bilhetes de deputados e vereadores em busca de um pedaço de terra, o Dr. Cezar atendia a todos, desde que entrassem na fila com os outros.
O Dr. Cezar falava que o bairro era como uma melancia grande e gostosa, onde todo mundo queria um pedaço.
As primeiras ruas de acesso ao bairro foram abertas por um trator pago pelo Dr. Hugo Brandt, a pedido do Dr. Cezar.
O estádio Vivaldo Lima ficou pronto em abril de 1969, mas, muitos operários que ajudaram a erguê-lo, permaneceram nas terras vizinhas.
Quando a Prefeitura de Manaus, na época, sob o comando do Advogado Paulo Pinto Nery, percebeu que o bairro já era uma realidade, passou a levar um tímido apoio às famílias através de algumas secretarias do município.
 As terras não eram totalmente do Estado, uma boa parte pertenciam, até onde se sabe a Família Cabral, de onde é hoje a Rua Zero até mais ou menos as margens da sapolândia. Da Rua 10, até a Avenida Desembargador João Machado (antiga estrada dos Franceses) era da família Bulbol, não se sabe ao certo de que forma o estado fez a desapropriação destas áreas, e nem se chegaram a serem indenizadas, mas tanto uma família, quanto a outra são lembradas pelos moradores. Na entrada do bairro uma das primeiras ruas é a Cabral Rolim e o principal posto de saúde leva o nome de Mansour Bulbol.
A cada lote que o índio dava, fazia uma família feliz, e estas famílias se sentiam agradecidas pelo resto de suas vidas. Todos os respeitavam muito, sentiam, e sentem até hoje um grande carinho por ele. Muitas histórias se contam até hoje sobre ele, alguns dizem que era muito namorador e que em cada rua tinha uma namorada. Outros dizem que as mulheres se sentiam atraídas por ele, pelo fato dele ser um homem extremamente forte, cabelos longos, jeitão sisudo, e olhar de mal. Na verdade quem teve a sorte de ganhar um lote de suas mãos, e conviveu com ele, diz que durante todo o tempo em que distribuiu terra no bairro, nunca pediu nenhum tostão em troca ou condicionou a doação a qualquer tipo de beneficio. A verdade é que sua figura vai ser sempre lembrada ainda por muito tempo, como o Índio que povoou o Bairro do Alvorada.
O povo humilde e sem recursos, usava todo tipo de material para construir suas casas, de forma rudimentar, fincavam as estacas e faziam as paredes com papelões e plásticos e às cobriam com palhas de palmeiras. E assim naturalmente o bairro foi se estendendo, pois quem já estava assentado, passava a ajudar o Dr. Cezar a assentar outras famílias, e eles próprios delimitaram as divisões do bairro em Alvorada I, II e III.

As dificuldades eram grandes, era o bairro mais longe da cidade, sem nenhuma infra-estrutura. Todos tinham que buscar água no riachinho, um córrego que ficava entre o Alvorada e o D. Pedro I, e que poucos anos depois seria conhecido por toda a cidade, devido à poluição, como sapolândia. Foram construídas dezenas de cacimbas, de onde se tiravam água para beber, fazer comida entre outras coisas.
Para ir ao centro da cidade, os moradores tinham que andar até próximo o estádio Vivaldo Lima, pois os ônibus trafegavam somente até a Rua Constantino Nery, ao lado do estádio.
Na rua oito, ainda sem asfalto, funcionou a primeira feira do bairro. Um dos primeiros comércios foi o bazar do Seu Waldemar, que também era dono do sistema de voz, que ele batizou de Amplificadora Voz Simpatia. Por muitos anos a voz Simpatia funcionou fazendo propaganda dos comércios e levando informação ao povo. Todos os dias ele retransmitia o Jornal da manhã da Rádio Difusora. A voz tocava muitas músicas na sua programação, e quase todas as segundas-feiras tinha sempre uma chamada de emprego, um aviso de perda de documentos ou o falecimento de alguém do bairro. A voz funciona até os dias de hoje. Devido o seu Waldemar se tornar evangélico, a programação foi alterada. Ele só liga a voz para dar avisos importantes, e aos domingos de manhã fazer a leitura da bíblia.




A origem do Nome

O bairro teve vários nomes até chegar ao que é hoje, nomes que só mesmo os primeiros posseiros ou quem viveu intensamente aqueles dias se lembra, pois cada um tem sua forma de contar esta história, que são tantas, e três delas chamam atenção pelos fatos curiosos e pelo folclore. Onde os personagens mais lembrados são o Dr. Cezar o Índio Peruano, um radialista muito famoso na época e a Igreja Católica. Todos são lembrados quando se buscam a origem do nome do bairro.

Bairro da Promessa

A Igreja Católica, através dos dirigentes da Paróquia de Nossa Senhora Auxiliadora, que é a padroeira do bairro, contam que o Governador do Estado na época, Dr. Danilo Duarte de Mattos Areosa, havia feito uma promessa aos moradores dos bairros flutuantes que se instalavam na orla do Rio Negro. A promessa era a de que iria dar terrenos a todos para deixarem o bairro flutuante. E então escolheu a área próxima ao Estádio Vivaldo Lima para eles. Assim nasce o bairro da Promessa. A promessa havia sido cumprida.
As atividades religiosas no bairro do Alvorada, começaram em 19 de setembro de 1969. Mas a primeira missa só iria ser celebrada em 24 de maio de 1970, pelo padre inspetor Daniel Bissoli.
As irmãs do Colégio Santa Teresinha e os Padres Salesianos passaram a fazer o trabalho de evangelização no bairro. Por ser uma área muito bonita e em começo de povoamento era comum se ouvir historias de situações intrigantes, segundo registros da paróquia, numa tarde de domingo, o padre inspetor estava celebrando uma missa ao ar livre, quando o tempo começou a escurecer. Logo em seguida começou a chuviscar, um pingo de água caiu no cálice em que o padre usava para por vinho. Então a gota de água, passou a se tornar o símbolo da presença de Cristo na vida daquelas famílias que iniciavam o novo bairro.


Bairro Cidade Satélite

O índio, Dr. Cezar, trabalhou na construção de Brasília e se deslumbrou com toda a arquitetura maravilhosa de Oscar Niemayer. Jamais se esqueceria de toda aquela beleza de formas e nomes, ele conta que o primeiro nome que deu ao bairro logo que começou a passar os lotes era Cidade Satélite. Ele pedia a todos que chamassem o bairro com aquele nome. Mas o povo humilde, vindo na sua maioria do interior, não se acostumou com um nome, um tanto estranho de ser pronunciado na época, e não aderiu. Por tanto este nome não durou muito tempo e logo foi esquecido por todos. Tanto que nas pesquisas realizadas não foi encontrado um só morador que lembrasse deste nome. Mais o Dr. Cezar Najar, garante que verdadeiramente, este foi o primeiro nome do bairro.

Bairro Cidade das Palhas

Mesmo com todo o sofrimento de quem morava num lugar sem a mínima infra-estrutura, o povo era alegre. Afinal de contas, estavam num lugar que era seu. Divertiam-se com a própria situação que passavam. Brincavam uns com os outros pelo fato de suas casas estarem cobertas de palhas. Isto porque tinham um prazo de levantarem seus barracos, o Dr. Cezar dava trinta dias, tempo que só dava para construir um barraquinho feito com três estacas na terra em forma de cruz e cobrir com palhas.
  Por este motivo se referiam ao bairro como Bairro Cidade das Palhas. Nome que passou ainda algum tempo na boca do povo, e que talvez tenha sido um dos mais marcantes, pois até hoje os antigos moradores que ainda vivem no bairro lembram com saudades da época da Cidade das Palhas. As noites na Cidade das Palhas eram mais longas e a lua era mais bonita segundo alguns moradores da época. A luz à lamparina, as ruas sem asfalto, em fim, tudo no bairro, mesmo sem conforto algum, tinha um cheiro mais gostoso, mais romântico, assim era o Bairro Cidade das Palhas.

Bairro do Alvorada por J. Aquino (Carrapeta)
Naquele período em Manaus, a diversão principal era o rádio. E a Rádio Difusora do Amazonas, era uma das mais ouvidas na capital amazonense. Consequentemente os seus locutores se tornavam famosos, principalmente os que apresentavam programas nos primeiros horários da manhã. Entre todos, havia um que se destacava pelo seu jeito irreverente e alegre de se comunicar. O radialista J. Aquino, carinhosamente conhecido na cidade como Carrapeta. Sempre que começava seu programa, mandava um bom dia a todos os bairros da cidade. E completava a saudação improvisando versos referentes ao nome do bairro. No caso do Alvorada, dizia que era o lugar onde o sol nascia bem mais bonito, o mais lindo alvorecer, o mais lindo Alvorada. E de tantos os outros ouvirem estes versos, naturalmente passaram a chamar o bairro de Alvorada.
Alguns contam que o bairro já se chamava Alvorada, mesmo antes dele começar a recitar esses versos em seu programa. E por tanto não poderia ter sido ele o verdadeiro autor do nome. Mas, se não foi ele que deu o nome ao bairro, com certeza ajudou a massificar, devido as inúmeras vezes que mencionou o nome do Alvorada no ar. O certo é que essa história passou a fazer parte do folclore do bairro. E só veio engrandecer a ainda mais a sua origem.

Bairro do Alvorada por Dr. Cezar(Índio)

Convidado para voltar a Brasília, a fim de receber uma condecoração pela sua participação na construção da capital do país. O Dr. Cezar, mais uma vez ficara maravilhado com o que via. Agora Brasília estava pronta.
A homenagem que ele e todos os outros operários, que ajudaram a construir a capital do país, foi realizada no Palácio do Alvorada, nome este que de imediato lhe fez lembrar a Cidade das Palhas, e que não sairia mais da sua cabeça.
Talvez ainda frustrado, pelo fato do primeiro nome que deu ao bairro não ter caído nas graças do povo, resolveu então tentar de novo. Logo que chegou a Manaus, como já morava no bairro, tratou de avisar a todos os seus vizinhos e amigos próximos, que o nome do bairro apartir daquele momento iria mudar para Alvorada, fazendo assim uma alusão ao Palácio do Alvorada de Brasília, lugar que jamais esqueceria e que homenageava dando nome ao Bairro que ajudara a fundar. Aos poucos o nome foi ganhando espaço no meio da comunidade, e como acontece com tudo o que é bom, se tornou popular. E assim o Dr. Cezar conseguiu fazer o que queria dar um nome ao local, que com a ajuda de vários outros operários, ergueu do nada e se transformava em um lugar dos mais bonitos da cidade. Além de ter possibilitado teto a vários necessitados. Por tudo isso o Alvorada lhe lembrava muito a cidade de Brasília. Pela força com que nascia do nada e se transformava em uma das mais importantes do país. 
Essa versão sem dúvida nenhuma é a que tem maior consistência, pois muitos moradores antigos confirmaram, além é claro de ser uma historia muito interessante.
Este bairro tem tudo haver com a origem do Dr.Cezar, índio peruano, que desde criança, acostumado a conviver com a natureza e as coisas simples do mundo, sempre agradecia aos deuses o amanhecer de um novo dia, Alvorada o crepúsculo matutino, o principio, o começo de tudo, o alvorecer, um novo amanhecer. O nome desse bairro tinha que ser Alvorada, pois, seus habitantes viam nessas terras o recomeço de suas vidas, ou o começo de tudo, e a cada dia, um novo amanhecer.